Em live organizada pela Atempa, educadores e engenheira do DMAE debatem as consequências da enchente e as perspectivas para a educação pública

Nesta terça-feira (18), a Atempa realizou a Live Crise climática, negligência dos governos e a destruição da educação pública. A iniciativa teve como objetivo debater a realidade das comunidades escolares mais atingidas pelas enchentes, as consequências da destruição dos serviços públicos e o descaso dos governos.

Débora Camargo Strada engenheira química do Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE), iniciou a live apresentando dados significativos da pesquisa que está realizando, entre eles informações sobre a formação de Porto Alegre, o histórico de enchentes, o Código Florestal de 1984, as modificações trazidas pela urbanização, higienização social (remoção de territórios negros, gentrificações), canalização do arroio Dilúvio, criação do Departamento de Obras e Saneamento e ações preventivas.

“É importante salientar as graves consequências trazidas pelo desmonte dos serviços públicos como a extinção do DEP, em 2017. As estruturas estão sucateadas e há um número muito menor de servidores. Há ainda o descaso com a legislação ambiental, que representa o descredito na ciência e a grave negligência dos governos”, frisou.

A palestrante destacou também que os bairros mais afetados da cidade contam com a maioria da população negra entre os mais vulneráveis.

Logo após, educadores(as) de escolas que sucumbiram a enchente fizeram relatos sobre a situação e trouxeram reflexões significativas sobre as perspectivas futuras.

O historiador, especialista em alfabetização e diretor da EMEF Presidente João Goulart, Manoel José Ávila apresentou imagens aéreas sobre a situação da escola e seu entorno, mostrando a destruição causada pelos alagamentos.

No entorno da escola, há a ocupação Farroupilha formada, em sua maioria por famílias venezuelanas, que representam quase 20% dos alunos da escola. “A forma como as comunidades mais vulneráveis foram atingidas chama a atenção para o racismo ambiental, como esses espaços são construídos de forma a privilegiar ou segregar a população de acordo com os locais e espaços em que são construídos”,

observou.

O professor fez uma comparação importante entre o período da pandemia de Covid e a enchente. “Nossa comunidade foi a mais afetada pela pandemia devido as questões de vulnerabilidade social. Agora, vivemos a repetição desse momento com situações como a exigência de sair de casa para trabalhar, independente dos efeitos da invasão da água nas casas das pessoas”, destacou.

“Penso que quando se fala em destruição, algumas coisas talvez tenham ganho espaço propício para melhorar como, por exemplo, inserir a educação ambiental no currículo escolar. Precisamos reflorestar a escola, fazer a concepção de floresta entrar no ambiente escolar”, pontuou.

Sabrina Garcez, pedagoga e especialista em Educação Infantil e Especial e diretora da EMEI Miguel velasquez, também expôs a situação da escola e da comunidade escolar após a enchente. “Cerca de 90% das famílias da nossa escola perderam tudo”, relatou.

“Nossa escola e um espaço de resistência na área ambiental, pois por nossa iniciativa, conseguimos fazer com que a comunidade entregasse os resíduos em nossa instituição, além de estruturarmos uma fazendinha”.

“O projeto de destruição e desmonte está tão enraizado, que muitas vezes passa despercebido. Para mim parece que a enchente ainda está presente no dia a dia, como se tudo começasse a ser planejado após esse período”, enfatizou.

Sabrina fez questão de ressaltar a dedicação do grupo de monitoras e professoras da escola para a reconstrução dos espaços e destacou a importância de lutar pela reconstrução nos territórios. “São 152 famílias dependem de nós e esperam o nosso retorno. E sabemos que há interesse financeiro na área em que a escola se encontra, para o mercado imobiliário e grandes empresas. A reconstrução das escolas e das casas precisa ser dentro do território”, afirmou.

Paulo Sérgio da Silva, pós-doutorando em Educação, com pesquisas sobre ERER, Educação Antirrascista e Educação Escolar Quilombola frisou a mesma questão destacada por Sabrina. “Enquanto discutimos as formas de retomar nossos afazeres pedagógicos dentro dos territórios, há empresas fazendo exigências financeiras para que não se retirem desses locais.”

“Esse é o momento de ressignificar o papel da educação. O projeto do governo é o da destruição da educação pública, das escolas cívico militares, do negacionismo, que vêm aos poucos tentando abafar tudo que está acontecendo. Pensar sobre isso a partir da realidade local é uma possibilidade de trabalhar ainda mais uma educação crítica sobre o modelo de sociedade que queremos e que, definitivamente, não é esse que está posto”, afirmou.

A diretora da Atempa, Luciane Congo, mediou a live e destacou as consequências da negligência do governo com a educação pública e as comunidades, em especial as que se encontram em situação de vulnerabilidade social.

“Vivemos uma realidade de investimentos aquém na educação pública e uma somatória de escândalos na secretaria municipal de educação, que não cessam. Neste momento em que temos que pensar na reconstrução, devemos pensá-la de forma mais integrada com o território das comunidades escolares. Seguimos na luta em defesa da educação pública e da qualidade dos serviços públicos”.